André Villas-Boas: “Futebol é caos!”
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A revista “O Nosso Zenit” convidou o treinador do Zenit André Villas-Boas para fazer uma pausa de duas horas do futebol na propriedade do famoso pintor Russo Ilya Repin. No caminho para lá o nosso treinador falou sobre as suas ambições, motivações e sobre o seu trabalho no Zenit. 

— Onde estava e em que dia soube do interesse do Zenit?
— Eu estava com a minha família nesse dia. Recebi uma chamada do meu agente dizendo que tinha recebido uma chamada do Zenit. Ele disse que o Zenit estava interessado em mim e que seria uma boa ideia termos reunião. Rapidamente organizamos um encontro com o clube e aí começaram as negociações. Isso aconteceu pouco depois do Luciano ter deixado o Zenit após 4 anos de muito sucesso. No encontro falei sobre a minha filosofia no futebol e a forma como vejo o jogo, sendo que o clube me explicou como tudo está organizado e quais são as ambições do clube. E sabes, nós tínhamos muitas coisas em comum, portanto o Zenit decidiu avançar e fez-me uma proposta. Penso que o mais importante nestas situações é a troca de ideias. O nós fizemos isso.

— Então passou cerca de uma semana desde que saíram os primeiros rumores até à assinatura do contrato.
— Penso que a razão para isso foi a mesma: eu e o clube tínhamos os mesmos pensamentos e ideias portanto todos nós queríamos fechar todos os detalhes o mais rápido possível. Esse foi o principal factor.

— Aposto que não estaria de todo à espera de uma chamada da Rússia.
—. Porque não? O Zenit é um grande clube. O Zenit quer vencer e dar um passo em frente. Portanto quando tudo aconteceu o meu interesse foi imediato. Eu quero vencer títulos e o Zenit dá-me essa oportunidade.

— Podia ter esperado até ao Verão e depois escolher entre 10 clubes de topo interessados em vez de 1.
— Inicialmente eu tinha a ideia de esperar até ao fim da época e aí pensar no passo seguinte mas não queria deixar passar a oportunidade de vir para aqui. Portanto no fim fiquei extremamente satisfeito com a minha decisão. Estou muito motivado e sempre quis testar as minhas capacidades em diferentes ligas. Eu foco-me mais no tipo e perfil do clube a que me possa juntar e foi por isso que aceitei imediatamente vir para aqui e não esperar mais.

— Qual foi a mensagem mais surpreendente que recebeu no telemóvel após teres vindo para o Zenit?
— Eu recebi muitas mensagens e chamadas, sendo que todos estavam felizes por mim. Os meus amigos, a minha família – todos estavam extremamente felizes por mim.

— E ninguém te escreveu: “André para onde estás a ir?”
— Haha, não. Claro que não.

— Praticamente todos os jogadores estrangeiros prometem que vão aprender Russo. Adivinhe quantos na verdade o fizeram.
— E eu tenho medo que não vou ser diferente. O Russo não é uma língua fácil. Para um treinador o mais importante é ser capaz de expressar as ideias. Vamos ver o que vai acontecer. Mas para já não estou a pensar nisso. Neste momento para ser honesto só penso em como vencer a Liga Russa. Também quero tentar aprender a língua mas a primeira prioridade é conseguir resultados em campo.
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— O que conhecia da Liga Russa há um ano atrás?
— Eu treinei frente a equipas russas antes. Quando estava no Porto jogamos frente ao Spartak e CSKA e como treinador do Tottenham jogamos frente ao Anzhi. Não tive a oportunidade de treinar frente ao Zenit mas obviamente que vi os jogos do Zenit frente ao Porto deste Outono na TV. A Liga Russa é uma das mais fortes na Europa e está neste momento em oitavo no ranking europeu e ainda existe muito trabalho a ser feito. Os clubes Russos são perfeitamente capazes de ter os mesmos sucessos que já tiveram anteriormente. Talvez a mudança do calendário na Liga Russa tenha tido algum impacto e a Rússia perdeu alguns pontos no coeficiente da UEFA por essa razão mas a Liga no geral está a melhorar. Existe potencial económico aqui, existem bons jogadores e no geral a Liga é muito competitiva. Isso pode ser facilmente visto nos últimos resultados.
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— Fale-nos da sua infância. Com que é que as crianças portuguesas sonhavam nos anos 80?
— As crianças portuguesas sempre tiveram o mesmo sonho – ser jogador de futebol. O futebol está na nossa cultura. Existem muitos espaços excelentes e oportunidades, embora as pessoas joguem cada vez menos na rua. No entanto todas as crianças querem ser o próximo Ronaldo. Temos a sorte de termos boas academias e formamos uma série de bons jogadores. Temos um bom sistema de ensino e uma boa escola de treinadores. Quando a UEFA promove os encontros de treinadores de elite existem sempre 3 ou 4 portugueses lá. É claro que o Mourinho teve uma grande influência nisso. Muitos seguiram os seus passos e agora muitos não sonham apenas em jogar mas também em treinar.

— As histórias dizem que a sua ligação ao futebol começou com uma carta ou uma conversa com o Bobby Robson. Diga-nos como realmente tudo aconteceu.
— Eu conheci o Sir Bobby porque vivíamos no mesmo prédio e regularmente cruzávamo-nos no caminho. Normalmente encontrava-o no parque de estacionamento quando ele vinha para casa após os treinos ou jogos. Eu era um grande adepto do Porto e uma vez aproximei-me dele para falar sobre o meu clube. Começamos a falar sobre futebol e ele disse que se eu quisesse eu podia ir aos treinos do Porto e ver com os meus próprios olhos. Claro que eu aceitei e começamos a ir juntos. Eu sentava-me na bancada, tomava algumas notas e analisava os treinos embora na altura fosse cheio de pensamentos de criança claro. Ele ajudou-me a ser aceite no curso de treinadores pois eu era demasiado novo para entrar. Eu tinha 17 anos nessa altura e havia limite de idade. No fim ele conseguiu fazer-me entrar e eu comecei a minha educação como treinador. Tudo aconteceu muito rápido depois disso. Sir Bobby foi para o Barcelona e eu tive a sorte de encontrar trabalho na academia do Porto e a minha carreira começou aí. Depois veio o momento em que o José Mourinho foi para o clube e eu entrei no seu staff técnico na primeira equipa do Porto. O que sempre me surpreendeu no Sir Bobby foi o facto de na verdade ser raro encontrar um treinador que esteja tão disposto a partilhar as suas ideias. E eu fui extremamente sortudo pois ele aceitou falar das suas ideias com um jovem. Ele podia apenas ter fechado a porta e dito: “É suficiente, não me chateies”. Mas eu fiquei amigo dele e da sua família. E estou-lhe incrivelmente agradecido.

— Quer também encontrar um aprendiz agora?
— Pode-se dizer que já tenho um. O meu scout, o Daniel, veio a primeira vez falar comigo para uma entrevista e agora trabalha comigo.

— Foi de um país quente como Portugal para a Escócia. Como foi?
— Foi tudo bom pois os escoceses são pessoas maravilhosas e simpáticas. E os cursos de treinador que eu tive eram focados em questões práticas e não em teoria. Era-te dada uma equipa jovem e era-te dito para os meteres a treinar com um objectivo, fosse ele atacar ou defender. No geral tínhamos mesmo nós de trabalhar com a equipa. Tínhamos de motivar os jogadores e prepara-los. Portanto isso foi uma experiência muito boa para mim.

— E depois seguiram-se as Ilhas Virgens Britânicas
— Sim, em determinado momento da minha passagem pela academia do Porto eu queria tentar algo novo. Uma posição abriu para a associação de futebol das Ilhas Virgens Britânicas. Eu entendi que podia ser um trabalho interessante. Eu tinha 21 anos e era assistente do treinador da equipa sub-14 do Porto e fui convidado para ir para as ilhas para a função de coordenador para o desenvolvimento do futebol jovem, e isso era um trabalho a sério, a tempo inteiro. Claro que eu era jovem e não tinha um currículo tão bom mas tivemos algumas conversas por telefone e eu fui lá passado duas semanas.

— Onde é que uma pessoa encontra uma posição aberta para a federação de futebol de uma ilha nas Caraíbas?
— Na revista da associação de treinadores da Federação Inglesa. Quando tiras cursos de treinador recebes trimestralmente uma revista onde eles podem falar sobre diferentes exercícios, tácticas e por vezes também haviam oportunidades de trabalho. Outras pessoas viram esta oportunidade. A revista era lida por muita gente. Mas mais uma vez tive sorte. É óbvio que eu não tinha muita informação mas quando se é jovem estamos sempre prontos a tomar riscos.

— Treinar uma equipa nacional quando só se tem 21 anos é obviamente sempre um risco.
— Mas eu não era um treinador. Eu estive primeiro a trabalhar com o futebol jovem e depois tornei-me director técnico da federação. Eu não treinei a selecção nacional. Ou melhor, eu preparava a equipa mas não era um treinador.

— Como é a Liga das Ilhas Virgens Britânicas?
— Existem seis equipas. Todas elas amadoras claro. Mas o mais excitante do projecto era que as ilhas estavam incluídas num projecto da FIFA para o desenvolvimento do futebol em pequenos países, portanto havia trabalho sério para ser feito ao nível de formação.

— Como é que uma pessoa encontra vontade para trabalhar quando rodeado por um resort de férias?
— Bem, os nativos ainda têm de fazer algo. Tudo lá é focado nos turistas e em servi-los. Por isso é que as equipas eram formadas pela polícia, empregados de hotel e bombeiros. E claro pelas crianças. Na verdade as pessoas lá estão mais interessadas em Basquetebol e Basebol mas o futebol está a ganhar força. Portanto nós estávamos focados em desenvolver algumas coisas básicas no desporto para as crianças.

— Os seus pais já estavam habituados a dizer-te adeus por essa altura?
— Foi difícil para eles. Penso que essas coisas são levadas de forma muito mais simples agora do que há 15 anos. Os jovens partem mais cedo ou mais tarde para ir estudar, embora no meu case tenha sido imediatamente para trabalhar. Mas eu tive sorte com os meus pais pois eles sempre me deram o máximo de apoio na minha ambição de ser treinador. Felizmente tudo funcionou da melhor forma. Eles foram fantásticos para mim.

— Tem irmãos ou irmãs?
— Sim, três. Uma irmã mais velha e um irmão e irmã mais novos. Portanto nós somos uma família grande e os meus pais sempre tiveram pessoas para tomar conta.
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— Depois voltou das ilhas para Portugal.
— Sim, eu tive a oportunidade de trabalhar com a equipa sub 16 do Porto e aceitei. Depois quando o Mourinho foi para o clube recebi o convite para a posição de olheiro dos nossos adversários. Encontramo-nos, falamos, mostrei-lhe o que podia fazer e ele convidou-me. Depois disso foram dois grandes anos no Porto mais 3 no Chelsea e 1 ano e meio no Inter.

— E durante todos esses 6 anos preparaste relatórios. Quando é que chegou o momento em que pensou: “Pronto, já chega”?
— Não houve um momento em que eu disse isso mas uma altura eu percebi que queria fazer algo diferente. Eu e o José tivemos uma conversa. Eu senti que podia dar mais do que o que eu estava a dar, trazer mais benefícios à equipa no processo de treino. Ele queria que eu fizesse só o trabalho de scouting. Portanto eu segui um outro caminho após 1 ano e meio no Inter.

— Então não lhe era suficiente trabalhar nos maiores clubes mundiais, certo?
— Existem vários papéis em várias equipas. É impossível determinar o quão grande ou pequena é a contribuição do que fazes para o resultado final. Apenas os jogadores conseguem determinar a sua contribuição. E os outros têm um trabalho na organização e o treinador decide o quão satisfeito está com o teu trabalho. Nessa altura eu queria estar mais envolvido portanto acabei por antecipar o inicio da minha carreira.
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— A melhor época para si até ao momento foi em 2001 com o Porto e foi estudada por todos os prismas. Pode dizer-nos o que é preciso fazer para uma equipa vencer 49 dos 58 jogos?
— Tive a sorte de ter tido jogadores incríveis na minha equipa, apenas isso.

— Todos os treinadores no mundo apenas fazem o seu trabalho mas nenhum venceu tantos jogos como os que venceu nesse ano.
— O futebol é um conjunto de histórias inexplicáveis. Para mim futebol é caos. O que está realmente a acontecer no relvado? Onze jogadores muito talentosos de ambos os lados que podem fazer coisas incríveis com a bola. Eles mostram momentos de brilhantismo, criatividade e de tomadas de decisões que na maior parte das vezes não podem ser recreadas nos treinos. São eles os que nos levam a nós, treinadores e equipas, às vitórias.

— E o que faz o treinador?
— O treinador juntas o processo de treino e a motivação de forma a que os jogadores estejam prontas para mostrar todas as suas qualidades. Se isso pode acontecer então o processo está perto de terminado.

— É a motivação um dos maiores aspectos do dia-a-dia de um treinador moderno?
— Sim, penso que a motivação é decisiva. Existem vários treinadores diferentes e várias aproximações diferentes a nível de treino e táctica, mas a única coisa que todos os treinadores ambicionam é ter os seus jogadores no pico de motivação quando eles vão para o jogo.

— Como faz para motivar os jogadores?
— Tento sempre encontrar um equilíbrio entre o que eu posso oferecer á equipa no treino e o impacto que posso ter emocionalmente nos jogadores. Claro que cada pessoa reage de forma diferente aos estímulos e é minha função e do meu staff procurar uma forma de perceber o que faz a pessoa reagir. Portanto tempo de olhar para cada pessoa de forma separada.

— Aqui temos um case study: Está em Perm e a sua equipa não fez um único remate à baliza na primeira parte. Tem 15 minutos durante o intervalo para motivar 11 jogadores.
— Quando tens jogadores de top tudo se torna fácil. Eles sabem perfeitamente o que precisam de fazer. A mudança vem de dentro de cada individuo. Os treinadores estão lá para mostrar um caminho, só isso. As respostas são eles que a dão.

— Tem jogadores no Zenit que são mais velhos que tu. É mais difícil motiva-los?
— É normal existirem situações na vida onde a idade e experiência são importantes mas é mais importante que trabalho fazes e que resultados obtens. Portanto é necessário ter a habilidade para convencer os teus jogadores em determinada situação. Independentemente do que faças na vida, vais sempre ter de conviver com pessoas que são mais velhas que tu e com pessoas que são mais novas que tu, mas no fim é a tua própria conduta que vai colocar o processo em andamento ou não. Eu não tenho problema com a idade. Tenho amigos que estão envolvidos em grandes negócios e têm 28 ou 31 anos por exemplo. Mesmo aqui no Zenit o Director Geral tem 32 anos. Pensas que ele tem algum problema com a sua idade? Qualquer trabalho no mundo é sobre competência e perícia, não sobre a idade.
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— Foi o Zhirkov no Chelsea o seu primeiro jogador Russo?
— Hmm, sim. Trabalhei com o Alenichev quando fui assistente do Mourinho, mas o Zhirkov foi o primeiro jogador Russo que treinei.

— Os jogadores Africanos são reconhecidos pela sua grande resistência. Os jogadores Portugueses são excelentes no jogo ofensivo. E os jogadores Russos? São reconhecidos por que característica?
— Na minha opinião pela sua técnica. Isso surpreendeu-me muito. O que quero dizer é que estes jogadores têm talento desde que nasceram mas o facto de terem atingido um nível técnico tão alto significa que fizeram muito trabalho para desenvolver as suas habilidades. Alenichev é um jogador com uma excelente técnica, bem como o Zhirkov ou o Fayzulin é também um bom exemplo. Portanto eu apontaria a qualidade técnica dos jogadores Russos à frente de tudo. Isso impressiona-me verdadeiramente.

— Queria manter o Zhirkov em Londres, certo?
— Sim

— Alguém percebeu a razão para ele escolher Makhachkala em vez do Chelsea?
— Isso foi a sua decisão. Não posso ser responsável por decisões de outras pessoas.

— Ele deixou-lhe uma garrafa de vodka quando ele deixou Londres. Onde está essa garrafa agora?
— Levei-a para Portugal e está em minha casa. Fiquei surpreendido pela positive pois só trabalhamos juntos algumas semanas. Eu via-o como defesa esquerdo mas a verdade é que ele gostava mais de jogar no centro. Colocamo-lo no centro em alguns jogos da pré-época e ele jogou muito bem nessa posição. Portanto só tive impressões positivas dele.
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— Fica zangado quando é criticado?
— Toda a gente pode pensar o que quiser e eu respeito a opinião das pessoas. É o seu direito. A crítica não me afecta de nenhuma forma.

— Em geral como considera a sua relação com os jornalistas?
— Muito boa

— Quanto tempo por dia passa a ver as últimas notícias?
— Não passo muito tempo. Ou melhor, não reservo nenhum tempo especial para isso. Posso ler os jornais, ou um livro, ou leio algo sobre futebol, as notícias do dia. Penso que é importante para o treinador estar informado sobre o que está a acontecer à volta do mundo, na cidade e no país onde trabalha.

— Interessa-se pelas redes sociais?
— As redes sociais têm muito poder. Elas mudaram o mundo recentemente. Basta ver o Twitter – dá um acesso imediato à informação. Tudo acontece no momento e as pessoas têm de se adaptar a isso. É uma grande ferramenta, se as soubermos usar correctamente. Mas eu não uso nenhuma rede social.

— E segue as páginas do Instagram dos seus jogadores?
— Não, de forma alguma. Mas eu sei da foto que eles tiraram logo após o jogo frente ao Amkar e gostei da foto. Eles partilharam um pouco de um momento de equipa e da sua felicidade com os adeptos e na minha opinião isso é fantástico.

— Se pudesse tirar uma selfie com qualquer pessoa do mundo, com quem seria?
— Hahaha, isso depende do momento. Não posso nem dizer ou escolher uma pessoa.
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— Viu o filme Moneyball?
— Sim, vi

— É aquilo tudo verdade?
— É uma história verdadeira. Esse método é usado com sucesso mas no basebol. Mas no meu caso, pessoalmente eu acredito mais que o futebol é caos. As coisas podem mudar a qualquer momento no relvado. Portanto as estatísticas devem ser tomadas em consideração mas deves perceber o que procuras. Sou um adepto das estatísticas mas não ultrapasso certos limites.

— Como é que é o seu relatório pré-jogo?
— Primeiro focamo-nos em algumas questões básicas, tal como o sistema, equipa inicial, substituições mais normais, resultados recentes, etc. Depois podemos ser um pouco mais específicos com o número de passes, direcção e movimentos dos jogadores, direcção dos passes. Olhamos quem é mais efectivo em determinados momentos. Não vale a pena passar toda a informação aos jogadores mas tens sempre de estar preparado para usar toda a informação no momento certo.

— As estatísticas tornam o futebol mais científico?
— Não, eu estava a dizer o contrário. Podes usar estatísticas e a ciência mas o futebol é caos e imprevisível, um jogo onde tudo pode mudar num pequeno momento. Essa é a razão para o futebol ser tão especial e popular.

— Portanto duas horas de treino teórico não faz parte do seu método?
— Não, de forma alguma.

— Nós sabemos que quando trabalhava com o Mourinho fez um DVD sobre cada jogador para que ele pudesse ver o que esperar no próximo jogo
— Fizemo-lo porque esse jogo requeria uma preparação mais especial que o normal. Portanto fizemos um DVD de cada jogador no qual descrevemos o que pode acontecer numa zona ou outra. Mas mais uma vez, isso é só informação, não significa que tenha tido um papel decisivo no resultado final.

— Outra história sobre a sua carreira como olheiro é que costumava ir ver os treinos dos adversários. Isso é verdade?
— Sim, por vezes sim. Agora é mais difícil de o fazer pois as equipas trabalham de forma mais fechada. Mas antes, quando tínhamos duvidas sobre a estratégia do nosso adversário, nós usávamos esse método.

— Digamos que este ano tudo será decidido no último jogo da Liga Russa frente ao Kuban. Vai alguém voar para Krasnodar alguns dias antes do jogo?
— Talvez! Mas com o acesso à informação que existe nos dias de hoje dificilmente isso será necessário.

— Outra situação: Vamos dizer que vai jogar para a Taça da Rússia frente a uma equipa do Leste da Rússia que joga na segunda Liga. Como vai preparar o jogo frente a uma equipa da qual os seus jogos não são sequer filmados ou são filmados com uma camera atrás da baliza?
— Essa é uma situação mais difícil. Nesse caso temos de usar outros métodos. Pelo menos enviar o nosso próprio cameraman para os filmar.

— Aqui fica uma pergunta de milhares de estudantes: Se jogares Football Manager no computador é possível perceber melhor o futebol?
— Só em termos de ter alguma informação básica, nada mais.
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— Quais são os planos para este Verão?
— Ainda não sei. Talvez eu vá trabalhar de alguma forma para o Mundial mas mais do que tudo estou a planear relaxar com a minha família.

— Já organizou a pré-época da próxima temporada?
— Neste momento estamos à espera do calendário preliminar para a próxima temporada, portanto mas saia isso podemos começar a planear. Não há datas para já, portanto é difícil fazer planos. Mas existe outro problema, que é o facto de um grande número dos nossos jogadores ir jogar o Mundial, assim o espero. Por outro lado tudo depende de que provas vamos jogar para o ano. Tudo isso deixa questões e temos de tomar isso em consideração. Mas para já estamos a planear 7-8 dias de treino em São Petersburgo e ir a algum local na Europa Central.

— Para Portugal não?
— Não, certamente que não vamos lá. É extremamente quente lá no Verão.

— Com o Tottenham foi para a Jamaica. Foi uma boa experiência?
— Não, não fomos para a Jamaica. Fomos para os EUA e Ásia e depois fomos às Bahamas após o fim da época. Mas foi mais um desejo dos donos do clube do que qualquer outras coisa relativa a competição ou preparação.

— Existe alguma lógica para as equipas Europeias irem a tours pela Ásia? O CSKA foi no ano passado e depois passou um mês a recuperar disso.
— Penso que se existe um interesse comercial por parte do clube então precisamos de nos adaptar e encontrar em conjunto uma solução. Claro que se formos a algum local por 2 semanas isso dificilmente se pode considerar uma boa opção. Mas se consegues encontrar um bom local de treino, com adversários de qualidade, então porque não? Mas eu prefiro treinar na Europa onde se pode encontrar bons adversários e o tempo é menos agressivo do que na Ásia ou nos EUA.

— Já apontou todos os problemas que tens para resolver neste Verão?
— Não, neste momento estamos focados em vencer a Liga Russa. Isso é o principal. Temos de o fazer e depois sim começar a preparar mais. Claro que temos uma ideia do que o que queremos fazer no futuro e o clube tem de estar preparado para isso. Nós discutimos isso com a direcção e os nossos desejos coincidem.

— Tem também o desejo que terminar as reformas que o Spalletti falou durante o ultimo ano e meio?
— Eu não tenho ideia quais são. Mais uma vez, agora o mais importante é vencer o campeonato. No futuro queremos ter resultados na Europa, na Champions League. Essa é a ambição do clube e uma das razões pela qual vim para aqui. Mas não tenho a tarefa de mudar algo no clube.
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— Alguma das equipas anteriores onde treinaste foi criticada por não ter jogadores locais suficientes?
— Quando o clube tem jogadores que aparecem da sua própria equipa jovem, isso é sempre um sentimento especial. As pessoas têm a mesma opinião sobre isso em qualquer lugar do mundo. Mas nem todos os clubes podem trabalhar como o Barcelona. Jogadores jovens são sempre um risco. Tens de lhes dar toda a confiança neles e testa-los. E nisso é preciso ter em atenção a filosofia do clube e as tarefas que se tem. O Barcelona tem a possibilidade de fazer o que quiser mas nem todos os clubes podem fazer isso.

— Disse que a primeira chamada que fez de um telefone do clube foi para o director da Academia do Zenit. Já houve algum jogador jovem que lhe tenha impressionado?
— Sim nós falamos ao telefone e eu convido um grupo de jovens jogadores para cada treino. Alguns deles têm continuado e têm-se mostrado. Penso que isso é importante. O Artem Simonyan está a trabalhar connosco por exemplo. Espero que possamos continuar com isto. Tivemos 4 jovens guarda-redes , 2 ou 3 diferentes defesas centrais , 2 avançados, 4 extremos e 3 médios nos treinos. Vimos todos esses jogadores mesmo que num pequeno espaço de tempo. Agora fizemos uma pequena pausa pois a segunda equipa do Zenit está em Itália mas quando eles voltarem, vamos continuar a vê-los.

— Pode um jovem jogador ser tão convincente que te faça mudar de ideias em preencher uma posição com um jogador de fora do clube?
— Sim, claro.

— Mas já tem uma ideia das transferências que vai querer fazer este Verão?
— Eu tenho de ter uma ideia claro.

— Vão haver grandes mudanças na equipa?
— Existem discussões que eu tenho de ter com as pessoas no clube no momento apropriado.

— Existe algum país onde toma mais atenção aos jogadores?
— Nós estamos à procura em todo o lado, tal como qualquer clube de topo deve fazer. Eu posso dizer que algo vai acontece pois nenhum clube pode sobreviver sem trabalhar no mercado de transferências. E nós não somos excepção.
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— Em Inglaterra disse que queria ser treinador por 15 anos e depois iria ao Dakar.
— Sim é possível que sim.

— Possível mas não um facto?
— Bem vamos ver se serão 10 ou 15 anos. Mas um dia eu vou fazer algo fundamentalmente diferente que não futebol.

— E o que vai ser?
— Ainda não o sei.

— Então não serão corridas de rally?
— Talvez seja. Toda a minha família gosta de desportos motorizados. Não sei se vou conseguir ou não, mas gostaria de o fazer.

— Não tem de ir a África ou esperar 10 anos. Existem corridas de rally na região de Leningrado, na periferia de São Petersburgo.
— A sério? Então talvez tenha de ir ver.

— Então os carros são o seu maior hobby?
— Sim, eu tenho uma paixão por tudo o que é movido por rodas. Tem uma boa colecção de carros clássicos e motas. Mas isso é a minha vida privada, preferia não falar disso.

— E sobre carros russos, conhece alguma coisa?
— Não conheço muito. Sei que antes havia problemas para importar carros, portanto os carros eram produzidos aqui.

— Um jeep russo UAZ iria ser perfeito na baixa do Porto.
— Eu tenho um jeep. Apenas uma marca de carros é made in Portugal –UMM. E é isso exactamente que eu tenho, um modelo de 1987. Mas para já não tenho nenhum carro russo.
***
— Já sabe onde vai dar um passeio no primeiro dia de folga em São Petersburgo?
— Tenho planos de ir ao Hermitage e depois quando o tempo melhorar ir num cruzeiro pelos canais. Assim que tenha tempo vou faze-lo. Mas em geral gosto muito de São Petersburgo. Qualquer cidade que tenha acesso ao mar é fantástica. Foi isso que permitiu aos Portugueses explorarem o mundo no século XV. E aqui em São Petersburgo não existe apenas o mar mas também rios e canis incríveis. Tudo está misturado aqui. E o facto de aqui tão a norte uma cidade destas foi construída é somente incrível. É claro que São Petersburgo é diferente, mas por exemplo é definitivamente tão bonita como Londres.

— É vencer a Liga Russa um bom estimulo para os seus sonhos futuros?
— Sim, claro que é. Se não o fosse eu não teria vindo para cá.

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