Daniel Sousa : "O futebol Russo é caracterizado por uma alta intensidade.”
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Daniel Sousa é o mais jovem dos assistentes de André Villas-Boas, sendo o responsável pela análise dos próximos adversários do Zenit. Em entrevista ao site do clube Daniel falou sobre o inicio da sua carreira no futebol, sobre como é a sua semana de trabalho e sobre as peculiaridades da Liga Russa. Para ler!

- Tu és provavelmente o membro mais misterioso da equipa técnica. Diz-nos mais sobre ti. Desde quando trabalhas no futebol?
- Eu trabalho desde o início com o André Villas-Boas ainda na Académica. Eu estava à procura de um treinador que estivesse disponível para me dar uma entrevista e dar-me conselhos na minha tese na universidade. Então foi assim que conheci o André e aconteceu que ambos partilhava-mos um entusiasmo pelo futebol de ataque. Ele ajudou-me com a tese, começamos a conversar e passado pouco tempo juntei-me à Académica, no inicio da carreira do André lá. A partir daí segui-o nas suas passagens pelo Porto, Chelsea, Tottenham e finalmente aqui no Zenit São Petersburgo.

- Quais são os teus estudos?
- Eu tenho um mestrado em Ciências do Desporto com especialização em futebol. Eu dediquei a minha tese ao futebol de ataque e durante o trabalho entrevistei e falei com o André Villas-Boas e com o Louis van Gaal. Nunca joguei futebol a nível profissional pois a minha carreira terminou ainda antes de ter começado. Sofri uma grave lesão quando era jovem e não pude continuar a minha carreira no futebol como jogador.

- As pessoas dizem que és um scout mas porque não chamar-te chefe dos serviços de inteligência?
- Não, não o diria dessa forma. Eu tenho feito aquilo que também funcionou com o André Villas-Boas no seu trabalho com o Mourinho. Em primeiro lugar trabalho toda a informação relevante sobre o nosso adversário, analiso os dados sobre a equipa com a qual temos de jogar. Mas o meu trabalho muitas vezes vai além dessa análise dos adversários. Eu posso analisar jogadores e dar uma conclusão preliminar sobre eles pois tenho uma série de informação sobre um grande numero de jogadores.

- Como é a organização do teu trabalho?
- Durante a semana eu analiso os jogos. Por exemplo antes do jogo com o Rubin tive de analisar os últimos 5 jogos da equipa e o desejável é ver um jogo ao vivo. Portanto, como regra, no fim-de-semana eu voo para observar o jogo do nosso próximo adversário. Isto é muito importante pois ao ver os vídeos pode-se parar a imagem, repetir um momento e com isso tudo pode-se perder o sentimento geral do jogo. No estádio também se vê todo o campo e movimentações. Em todo o caso depois eu também vejo cuidadosamente o vídeo do jogo usando os apontamentos que fiz durante esse jogo.

- A maior parte da informação que obténs vem da tua visualização dos jogos? Ou também trabalhas dados estatísticos, imagens e gráficos?
- No nosso trabalho usamos tudo. O ponto de partida é a visualização dos jogos. Depois tento confirmar os meus pensamentos iniciais com informação analítica e procurar por nuances que tenham passado ao longo do jogo. Eu uso algumas estatísticas específicas, não necessito de todas as estatísticas. O volume de informação é demasiado grande para ser tudo escrutinado ao pormenor. No meu trabalho devemos ser capazes de identificar os pontos realmente importantes.

- Depois discutes a informação com o treinador?
- Claro que a maioria da informação é transmitida na forma de relatórios baseados na observação dos pontos fortes e fracos do adversário, informação da equipa e táctica. Os relatórios são completados com fragmentos de vídeos que são depois também mostrados ao resto do staff técnico e jogadores.

- Tu crias algum vídeo específico sobre cada jogador ou treinador? Ou fazes uma espécie de vídeo único?
- Depende. Eu tenho um esquema geral de trabalho mas durante a semana é sujeito a vários ajustamentos dependendo de determinadas circunstancias até como o dia e hora do nosso jogo. Tudo depende do nível de especificidade que precisamos para o jogo seguinte.

- O Amkar e o Krylya Sovetov jogaram da forma que esperavas?
- Eles jogaram bem mas honestamente em termos tácticos seguiram o padrão esperado. Para mim isso é muito bom pois por vezes existem situações complicadas onde o adversário muda a forma de jogar de uma forma não expectável. Muitas coisas não posso controlar. Por exemplo se um dos principais jogadores do nosso adversário se lesiona antes do jogo com o Zenit provavelmente alguma coisa eles vão mudar na forma de jogar. Mas eu sempre olho a formação mais forte do adversário, tendo em consideração as acções dos jogadores nos últimos 5 jogos.

- E surpreendeu-te a utilização de algum jogador em específico?
- Alguns treinadores gostam de fazer mudanças significativas no jogo da sua equipa. Prever quando isso vai acontecer é muito difícil. Mas se tu mudas frequentemente algo nas acções dos jogadores em campo também é difícil fazer melhor do que nos jogos anteriores. O treinador pode fazer alguma correcção em alguns componentes do jogo mas isso não significa que a equipa tem apenas algo a ganhar. Na verdade também tem algo que vai perder.

- Os dois primeiros adversários na Liga Russa pareciam muito diferentes no seu estilo de jogo. Ou nas tuas análises encontraste pontos em comum?
- As equipas da Liga Russa têm algumas características comuns a quase todas, incluindo ao Krylya Sovetov e Amkar, que foram os primeiros adversários após a minha chegada a São Petersburgo. Mas claro que elas são equipas bastante diferentes até porque têm ao seu dispor um conjunto de jogadores com características diferentes. Portanto mesmo que ambos os treinadores decidam jogar por exemplo com uma linha defensiva mais recuada, as duas equipas têm formas diferentes de o fazer.

- Podes dizer algumas características únicas das equipas de futebol Russas?
- O futebol Russo é diferente do futebol noutros países. Posso dizer isso após ter visto um grande número de jogos da Primeira Liga Russa. Além disso no tempo que trabalhei no Porto a equipa jogou frente ao Spartak e CSKA. O futebol Russo é bom e é caracterizado por uma alta intensidade. Na Liga Russa as equipas normalmente pressionam na grande área adversária para tentar anteciparem-se a um passe. Por exemplo em Inglaterra isso não é típico.

- Analisas também o que a imprensa escreve sobre o próximo adversário?
- A minha função passa por filtrar a informação para o André Villas-Boas sobre coisas específicas. Tenho de ver tudo incluindo alguma informação da comunicação social. Depois disso eu filtro toda essa informação e selecciono aquilo que é necessário para o treinador fazer o seu trabalho. Mas a verdade é que em norma os leitores de jornais não precisam da mesma informação que nós temos e precisamos. Em Inglaterra existem dois ou três jornalistas dos quais eu gostava de ler os seus textos pois tinham em atenção determinados momentos curiosos dos jogos. Mas o que eu faço não é algo que eles possam usar no seu trabalho nem os jornalistas poderão fazer todo o trabalho por mim.

- Tu fazes muito trabalho de escritório na preparação dos jogos mas estás também envolvido de alguma forma no treino da equipa?
- No futebol devemos tentar estar envolvidos em todo o processo. Apesar da minha principal função ser a análise táctica do adversário é necessário também ter uma ideia clara sobre a nossa equipa.

- Sabias que há uma história a circular que tu és o campeão do mundo de Football Manager?
- Verdade? Eu nunca joguei Football Manager. Um amigo meu interessa-se muito pelo jogo mas embora eu saiba que quem o desenvolve usa alguma informação real sobre as equipas, o futebol no computador tem pouco a ver com o real.

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